HÁ FALTA DE TÉCNICOS
In Jornal Tal&Qual, 16 Novembro 2001
São cerca de 400 os optometristas em Portugal. Têm formação superior, as consultas são comparticipadas, mas legalmente não existem. Uma luta que dura há 25 anos.
Florbela Tibúrcio é optometrista e atende uma média de dez pessoas por dia no Oculista de Benfica, uma casa com 50 anos de existência, em Lisboa. Trabalho não lhe falta, mas é com insatisfação que revela os problemas que a sua classe atravessa já lá vão 25 anos: a falta de reconhecimento.
A questão é de facto paradoxal. O Estado dá aos optometristas formação superior em universidades públicas e comparticipa utentes que recorrem a estes técnicos; por outro lado, não os regulariza e faz com que sejam vistos como fantasmas.
“Qualquer um pode abrir um centro de óptica ou um oculista e receitar óculos às pessoas sem estar habilitado a isso. Não há ninguém que lhes possa exigir um diploma ou um certificado”, sublinha Florbela Tibúrcio.
Afinal o que é um optometrista e qual a diferença entre este e o oftalmologista? Toda. Os primeiros são técnicos especializados em medir a visão e compensar as suas falhas através da prescrição de próteses oculares, mais conhecidas como óculos. Do outro lado estão os médicos especializados em tratar todo o tipo de doenças ou outros problemas do foro oftalmológico. “O que nós fazemos é um acto físico, baseado na observação ocular, enquanto os oftalmologistas praticam o acto médico”, explica a optometrista.
Obstáculos
Florbela Tibúrcio considera que este “acto físico” devia ser praticado apenas por optometristas: assim os oftalmologistas ficariam mais libertos para tratar doenças e fazer cirurgias. “Gastam muito tempo a tratar de uma questão técnica que nós estamos habilitados a fazer. Desta maneira as listas de espera para consultas ou cirurgias não têm como diminuir”.
O problema é que, segundo conta, são muitos os obstáculos para que a regulamentação algum dia se torne uma realidade. “A Ordem dos Médicos não nos vê com bons olhos e considera que nós só devíamos existir se estivermos sob a alçada de um oftalmologista”.
A realidade portuguesa está muito longe do que se passa na Europa e outros países. Em Inglaterra e nos Estados Unidos o número de optometristas supera em muito o de oftalmologistas – e os primeiros são reconhecidos. Em Espanha existem cerca de 10 mil técnicos, muito acima dos 400 que há em Portugal, mesmo tendo em conta as diferenças demográficas. “Há muita falta de optometristas em Portugal. Prevejo que quando um dia a profissão for regulamentada, haverá uma ‘invasão’ de técnicos espanhóis”, concluí Florbela Tibúrcio.